Por Ademir Demarchi
Suave
como a morte, de André Luiz Cosme Ladeia (Penalux: Guaratinguetá, 2014).
Uma epígrafe de Dostoiévski dá o tom
desse livro de poemas: “Saí para me divertir, acabei num enterro”.
Essa frase, em meio aos poemas, pode ser
lida como metáfora da experiência de escrita poética: o autor se meteu a
escrever poemas e acabou sendo levado pela morte, tal como em “Piazza Navona”
(abaixo), o mais imaginoso e divertido do livro.
Esse encontro já era anunciado no
primeiro poema: “Quando nasci/ A morte/ Veio me visitar/ E me presenteou/ Com
seu relógio negro”, para marcar o tempo passado com a insônia de Cioran “que
aflige toda a humanidade”, numa “vigília constante, incessante”.
É dela e de seu silêncio que emergem os
poemas, como contundências contra a qual se deve ambicionar a suavidade da
morte.
NASCIMENTO
Quando
nasci
A
morte
Veio
me visitar
E
me presenteou
Com
seu relógio negro
O
coveiro que fez meu parto
Me
benzeu
E
depois
Começou
a preparar a minha lápide
As
bailarinas dançavam
Com
a morte
Ao
som de uma música lúgubre
Os
sinos badalaram
Para
comemorar o início
Do
meu enterro.
*
PIAZZA NAVONA
Na Piazza Navona
A morte me chamou
Ela apontou pra mim
Estendendo e dobrando o indicador
Como quem diz: “vem”
Surpreso, olhei para ela
Como quem pergunta: “sou eu? É comigo?”
Ela acenou com a cabeça
E fui a sua direção
Como podia negar um pedido desse?
As pessoas esperam a vida inteira
Por esse momento
E ela estava bem ali,
Na minha frente
- de túnica preta, mascarada e com tridente –
Chegou a minha vez.
Ela estendeu a mão e me abraçou.
Eu sorri e lhe dei umas moedas.
Foi uma das poucas vezes que
Morri
Alegre
Com a vida.
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