Tão breve quanto o agora
(Curitiba: Blanche, 2012) e Entre
arranhões e lambidas – haicais & gatos (Curitiba: Blanche, 2014) de Alvaro
Posselt
Introdutores do haicai no Brasil
Uma das mais importantes heranças da
cultura japonesa para o Brasil e em especial para o Paraná foi a forma poética
do haicai. Guilherme de Almeida é tido como um dos pioneiros a experimentá-la,
assim como Millôr Fernandes, que deu ao haicai um sentido mais abrasileirado,
em que predomina o senso de humor irônico, em contraste com a marca desse
poema, dada pela observação ingênua da natureza, à exceção talvez de mestres
como Bashô, que era sagaz na escrita e na observação. Leminski, com sua poética
quase frasista, à moda dos anúncios publicitários, de que foi profissional, deu
um modo próprio a esse gênero de poema, a ponto dele ter se transformado numa
espécie de praga que se inoculou em todo aquele que pensou em escrever poemas
nas últimas décadas.
Duas vertentes de haicais
Pode se dizer até que há duas vertentes em ação no país,
uma mais apegada à forte tradição cultural japonesa, que busca repetir o número
de versos e sílabas e a observação da natureza, típicas desses poemas, e outra,
mais abrasileirada, que remete à experiência de Millôr Fernandes e à
antropofagia oswaldiana que devora o modelo e o deglute abrasileirado e com
humor que se avizinha do poema piada estigmatizado pelos críticos do
modernismo, como se essa não fosse uma forma de poética aceitável.
De Leminski aos "haicaipiras"
Depois de
Leminski, Antonio Thadeu Wojciechowski e Domingos
Pellegrini tiveram experiências marcantes com essa forma literária, a ponto de
Pellegrini buscar uma variação pé vermelho, criando os “haicaipiras”. Essa
segunda vertente que abrasileira antropofagicamente aquela forma japonesa é a
que mais potencial apresenta, na medida em que é crítica e com o senso de humor
abole a ingenuidade. Por isso, por demandar uma inteligência arguta e atenta de
quem a pratica, é mais difícil mas nem por isso tem deixado de proporcionar
ótimos resultados.
Os haicais de Alvaro Posselt
Isso tudo podemos constatar num belo livro recém lançado em
Curitiba, Tão breve quanto o agora,
de Alvaro Posselt, que é professor de língua portuguesa, estudioso do haicai e
praticante das duas formas apontadas.
O senso de observação, o senso de humor,
a argúcia são qualidades comprovadas nesse livro, continuadas agora noutra
edição: Entre arranhões e lambidas –
haicais & gatos, belamente ilustrado para atrair a atenção desde o
leitor infantil até os que gostam de animais e especialmente de gatos. Abaixo,
selecionei alguns e deixo o leitor com os haicais de Alvaro Posselt.
Quem
eu sou de fato?
Meu
bicho de estimação
diria
o meu gato
*
Além
da linha inimiga
o
gato passeia pelo canil
O
cachorro já nem liga
*
Pode
ver a métrica
Para
moldar estes versos
só
com serra elétrica
*
Para
não perder o clima
peguei
o verso de baixo
e
rimei com o de cima
*
Eu
juro de pé junto
Com
o calor na capela
suava
até o defunto
*
A
vida não tem fim
Entre
túmulos e flores
uma
caveira acenou pra mim
*
Não
se empolgue
Na
minha feijoada
só
a orelha de Van Gogh
*
Esta
vida é um mistério
Perto
da maternidade
também
tem um cemitério
*
Temporal
divino
Para
ir a algum lugar
só
de submarino
*
Uma
boca maldita
espalhou
por toda a XV
que
o Bondinho apita
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