Planeta Terra, 12 de
maio de 2017 d.C.
Mestre,
O senhor não se recordará de mim (posso
chamá-lo de “senhor”? desculpe-me: não se trata de formalismo ou fórmula vazia:
aprendi a reverenciar os que chegaram antes e detêm muito maior conhecimento e
lucidez que eu).
Como dizia, nós nos encontramos algumas
vezes na Universidade. Para ser mais exato, foram quatro ocasiões:
Em 23 de março de 2000, durante a outorga
do título de Professor Emérito a Aziz Ab’ Saber no salão nobre da Faculdade de
Filosofia, Letras e Ciências Humanas. Aziz chegou apoiado por suas mãos.
Semanas depois, acompanhei a “Aula na
Greve” que o senhor proferiu no antigo gramado da velha Reitoria (hoje ocupado
pelo Complexo Brasiliana). Logo que o avistaram, um grupo de alunos curiosos
perguntou por sua amizade com Mário, Oswald, Drummond… Cercado de jovens que
discutiam os rumos da universidade, o senhor falou de todos eles, como se nos
convidasse para ler mais e melhor. Guardo o jornal da época, em que aparecemos
na mesma imagem...
No mês de outubro de 2001, assisti a sua
conferência inaugural do evento em comemoração aos 40 anos do Departamento de
Teoria Literária e Literatura Comparada. Cheguei bem mais cedo e peguei um
lugar encostado à janela da sala 8 do Prédio “das Sociais”. Lembro-me de o
senhor ter revelado duas “frustrações”: a de não ter formação em Letras e a de
não saber Latim… Recordo de guardar a Programação do evento com carinho,
orgulhoso por dividir a mesma página com o seu nome.
Em 26 de junho de 2003, o senhor deu uma
palestra para a disciplina “Seminários de Antonio Candido”, a convite do
(também) saudoso Professor Joaquim Alves de Aguiar, que estudava sua obra. Ao
final do encontro, colhi seu autógrafo pela segunda vez – no livro Teresina
e seus amigos (“Lembrança de Antonio Candido”). Uma colega tirou nossa
foto, que ela depois ampliou e me entregou.
Desde então, sua imagem também vive entre
as páginas de um de seus livros, juntamente com o primeiro autógrafo seu que
lhe pedi em abril de 2000 (aluno impertinente que militava em defesa de
melhores condições de ensino e trabalho, na universidade).
Queria lhe contar que “Dialética da
Malandragem” é um dos ensaios mais impressionantes que já li. Que as suas
reflexões me acompanham desde a graduação. Que dia desses, numa aula em que
conversarei sobre as Memórias de um Sargento de Milícias, discutiremos
seu ensaio (a meu ver, insuperável) sobre o notável romance de Manuel Antônio
de Almeida. Que as suas concepções em defesa de uma sociedade mais justa e
menos embrutecida estão sempre no horizonte, quando leio e comento a literatura
luso-brasileira.
Haveria tanto mais a dizer, mas isso seria
um ato de descortesia.
Aceite, por gentileza, esse punhado de
frases que pretendem romper o estatuto de relatório e a confissão em tom de
desabafo.
Muito obrigado, Antonio.
Candido.
Jean Pierre Chauvin
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