sexta-feira, 22 de junho de 2018

Foto: Leodoro


Leodoro


Todo dia, depois de acordar, quando o sol está bonito e quando não está, tenho o costume de olhar pela janela da sala o jardinzinho aqui de casa. As roseiras ladeadas por acantáceas e torenias que repousam à sombra do jasmim-manga. Descanso os olhos nessa visão segurando a habitual terceira ou quarta xícara de café antes do meio dia. E lá vem ele: o beija-flor.

O danado sempre brinca pra lá e pra cá, competindo o néctar das flores com o Cambacica. Dia sim e dia não, eu tento fotografá-lo. Quem me conhece sabe que coleciono fotos de pássaros e um beija-flor ainda não existe em minha coleção. Sinto que posso olhá-lo por horas a fio - ele continuaria ali dançando e paralisando no ar por anos até minha velhice chegar.

Mas, quando eu saco a câmera para registrar seu brilho esverdeado, o engraçadinho, com toda sua agilidade, vai embora, desaparece, em uma mágica desaparatação.

Faz alguns meses que tento fazer a bendita foto do bichinho e ele não posa para mim. Não importa a tocaia nem o quão silencioso eu seja, ele sempre sabe quando estou assistindo ou quando estou tentando fazer a grafia da sua luz. É como se meu interesse implorasse um segundo de atenção e, além, de néctar, ele viesse buscar alimento pro ego também.

Pois bem, dia desses surgiu um Sanhaçu aqui em casa, um pássaro azulado, coisa mais linda. Muito raro de se ver na cidade, principalmente nos dias atuais. Por sorte minha câmera estava carregada e do meu lado. Mirei, foquei, e quase atingindo o clímax com o clique, o bendito do beija-flor passa na frente, desfocando a foto. Percebi que o Sanhaçu estava invadindo território do manhoso beija-flor que não parava um minuto de tentar espantar o pontinho azul de suas flores.

Depois desse dia eu percebi que o ciúmes do beija-flor ia além de néctar. O Sanhaçu não roubava somente isso. O interesse ali pareceu por um segundo ser o foco de minhas lentes. Agora pelo menos eu tenho essa foto horrível do beija-flor: borrada, desfocada, cheia de ciúmes e desespero por atenção. O famoso “mirei no que vi e acertei no que não vi”. Bem que dizem que o que é seu ninguém tira.

A vida realmente lhe concede desejos, nem sempre do jeito que se espera. Eu ainda quero uma foto de beija-flor, bem tirada, focada e bonita. Mas esse aqui de casa é maluco demais, percebi que não serve.

Preciso de um beija-flor tranquilo, sem todos esses melindres. Afinal, beija-flor é beija-flor, dos milhões existentes, todos brilhosos e excêntricos, eu só escolhi o errado. E voaram para longe, ágeis e silenciosos.



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