quinta-feira, 20 de agosto de 2015

Avenida São Jerônimo. Antônio Parreiras, óleo sobre tela, 64,4 x 54cm, 1905. Acervo: Museu de Arte de Belém.

Por Edevaldo Leal Costav

Na Amazônia, fala-se muito em preservação da floresta. A afirmação de que o homem precisa aprender a conviver com a natureza  já é frase surrada entre ambientalistas e simpatizantes da causa ambiental. O homem, há anos, devasta a mata (ou o que resta dela). Mas qual a importância da cobertura vegetal nas cidades? Seria possível a vida em uma cidade sem árvores? 

Nas cidades, uma área verde mitiga o estresse das pessoas. Sossega os inquietos. Anima os  tristes. Embala a alma dos aflitos. À sombra de uma árvore, quem não se anima a caminhar a segunda milha? O verde da vegetação carrega as nossas angústias. Sem árvores, a cidade morre lentamente.

Na minha cidade, em plena região amazônica, não há árvores. Aqui não canta o sabiá. Sei que exagero. Há, sim, árvores em Belém e região metropolitana, conhecida como Grande Belém. Escassas em diversos espaços, me proíbo de continuar chamando Belém de “a cidade das mangueiras”: o túnel verde  alcança apenas as avenidas Nazaré, Magalhães Barata e parte, só parte, da José Malcher. Verdade seja dita: lá, as áreas verdes são abundantes. Lá, ficam os bairros onde  o rico repousa em cadeiras de balanço. No Bairro da Campina, encanta os olhos a Praça da República, de onde se vê o  belo e luxuoso Teatro da Paz. A Praça Batista Campos, no bairro e mesmo nome, surpreende com seu charme europeu, com seus córregos, pontes, caramanchões e coretos de ferro. Eu estou citando áreas verdes. E quase esqueço de mencionar o Jardim Botânico Rodrigues Alves, “um pedaço da floresta amazônica no meio da cidade” e o Parque Zoobotânico Emílio Goeldi, “a mais antiga instituição de pesquisa na região amazônica”. 

Situada no centro da Amazônia, a maior floresta tropical do mundo, com temperatura que pode chegar a 32º C ou mais, Belém é uma cidade em que a carência do verde se acentua quando se avança para a periferia. E, aqui, os sabiás são raros. Diria inexistentes.

Um século e alguns anos depois, a  pergunta que não deveria ser feita: onde estão as árvores dos bairros da Pedreira, da Marambaia, do Telégrafo, da Terra Firme, da Maracangalha, da Sacramenta, do Jurunas, do Guamá, da Sacramenta, da Terra Firme, de São Brás, da Marambaia, do Benguí, da Cidade Nova, de Marituba? Quem caminha por esses bairros sofre com o calor insuportável e o ar abafado, que deixa qualquer um  fragilizado.

Caminho por ruas mal conservadas da Cidade Nova. São 11 horas da manhã. Os raios solares atravessam a camisa. Queimam a pele. Agora, o perigo vem  da radiação solar. Um século de inércia de prefeitos. Como evitar que Belém, futuramente, seja um fantasma? Por enquanto, viver na Grande Belém é demasiadamente perigoso. Aprendemos a driblar  a violência do dia a dia das ruas. Mas não é possível driblar uma exigência dos pulmões: necessidade de ar puro. Sem o verde urbano, os gases tóxicos, a poeira e os materiais residuais entram na composição atmosférica. E, dessa mistura  venenosa, quem escapará?

Precisamos de mais praças arborizadas. Precisamos de mais parques ecológicos. Precisamos de áreas verdes. Precisamos de ar puro para viver. Belém pede socorro.

Quando saio às ruas de áreas menos ricas ou pobres, respiro um ar sujo. E, vulnerável, asfixiado, sinto um calor acima do que posso suportar. Nessas ruas, reclamo da  falta de vento de verdade, porque vento que pára por perda de velocidade deve ter outro nome. É pássaro cansado, sem rumo, estropiado, voando sem ter como pousar. O bater de estacas das construções me assusta. É a cidade que cresce, para cima. Aliás, porquê ? Em baixo, sobra a monotonia da paisagem.

Abro o jornal e leio a propaganda de um conjunto habitacional de luxo. O texto apelativo não deixa dúvida: a vegetação é  produto de consumo dos endinheirados. O conjunto fica dentro de um bosque. Os espaços verdes são oferecidos como diferencial. Então me dou conta: as conferências  das Nações Unidas sobre o meio ambiente, a  primeira, em Estocolmo, em 1972 e a segunda, no Rio  de Janeiro, em 1992, para a promoção dos espaços verdes nas cidades, pouco ou nada adiantaram. O direito à natureza continua sendo de  poucos. A Agenda 21 é um dos principais resultados da Conferência ECO-92 ou RIO-92. Que resultados? Rasgaram a agenda 21, inútil agenda 21. Belém completará 400 anos em 12 de janeiro de 2016, uma oportunidade para os moradores da  cidade comemorarem essa data e exigirem  árvores. Aqui, sugiro um bordão: muito mais árvores para Belém.

Sobre o autor

Edevaldo Leal Costav é formado em Direito pela UFPA e funcionário público de carreira jurídica do estado do Pará (atividade típica de Estado). Nasceu em Calçoene, em 1951, região de garimpo no Amapá, mas foi registrado em Belém do Pará. Possui, portanto, duas naturalidades: é, de fato, amapaense, mas, de direito, paraense. Antes de servidor público foi advogado e exerceu o jornalismo por mais de uma década em jornais do Amapá e do Pará. Escreve crônicas  e reside com a família no município de Ananindeua, no Pará, região metropolitana de Belém.

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