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Obra de Mazé Pebellini |
Por Ricardo Escudeiro
“escribo para traducirme.”
(In: Chacharitas & gambuzinos, de Ellen Maria)
que é que é isso
ora em crescendo ora em diminuendo entre a abóbada
palatina e o tapete vermelho
que é que é
isso que nos instantes que nomeiam
alegria
por ela devemos servir
mas é de bom grado no tempo que dominam
as nomenclaturas de tristeza
perguntarmos antes de encher o pote
oh bom senhor
quanto disto deseja
não sei
qual o gosto disso
uma mesma via
de lamber o gosto
de dizer o gosto
materna ou segunda ou
pode ser
carne ou não
mas e lacuna vazia
pode ser também até bifurcada tem
ou uma insônia
tipo um dormir ao contrário
e tem quem fala dormindo
ou traduções
a hora errada no seu relógio de pulso
é a certa de outro braço
em outro lugar de mundo ou pedaço de
adiantamento ou atraso é uma outra
que inventamos para dizer
mapa
me encontra na latitude tal
longitude essa
coordenada é uma outra que inventamos
para dizer
casa
as linhas que seguram e as que traçam
palavra
não são a dita ela mesma
mas dizer isso é já uma outra
falar
que dó
em áfrica ou qualquer outra embaixada
não trava paz entre as minas terrestres
e as pernas amputadas
diplomacia é uma outra que inventamos
para dizer
deserto
fazer o bem sem olhar a quem
mas com data local platéia e parafernália
abutres alimentando pombos
cobrar os créditos é uma outra que inventamos
para dizer
caridade
que pode ou não ser sazonal
que pode ou não ser teoria do benefício
uma lista de expressões estereotipadas
tem a
maior que a boca
mas é uma
ferina
deu com a
nos dentes
é uma outra que inventamos
para dizer
dicotomia
e ou parâmetro do humano
não saber guardar
segredo que todo mundo já sabe
a bola é minha joga quem eu quiser
é uma outra que inventamos
para dizer
lirismo
na foto de nove soterrados contar dez
no texto pensar
será que erramos aqui
é uma outra que inventamos
para dizer
empatia
encostar sem tocar na caixa
perceber a acústica torácica e seu altifalante
indefinidas polegadas
é mais outra que inventamos
para dizer
auscultar
interface de descoisar
aquilo que vai aí e cá dentro
que é que é isso
langue parole ou burburinho
uma língua
é uma língua e
outra coisa é outra cousa
Ricardo Escudeiro nasceu em Santo André-SP, em 1984, onde vive. É autor dos livros de poemas “rachar átomos e depois” (Editora Patuá, 2016) e “tempo espaço re tratos” (Editora Patuá, 2014). Graduado em Letras na USP, desenvolve projeto de mestrado com interesse em Literaturas Africanas de Língua Portuguesa. Atua no ensino fundamental II e no ensino médio. Possui publicações em mídias digitais e impressas: site da Revista CULT, Mallarmargens-revista de poesia e arte contemporânea, Germina-Revista de Literatura & Arte, Jornal RelevO, Revista Nefelibata, Revista Gente de Palavra, Revista SAMIZDAT, 7faces caderno-revista de poesia, Revista Pausa, Flanzine (Portugal), Revista Carlos Zemek, Revista Mortal. Publica poemas mensalmente na Revista Soletras, de Moçambique. Participou da antologia “29 de abril: o verso da violência” (Editora Patuá, 2015). Foi poeta convidado no Espaço Literatura da 13ª Feira Cultural Preta, em 2014, e do sarau Plástico Bolha, evento de encerramento da exposição Poesia Agora, no Museu da Língua Portuguesa, em 2015. É vocalista da banda Catastrophear.
EXISTENCIAL e DENSO, belo e verdadeiro POEMA, parabéns
ResponderExcluiré dos poemas mais lindos que já li.
ResponderExcluirQue coisa linda esse poema!!!
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