terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Abaixo, íntegra da entrevista convedida por Marcelo Ariel, deste blog, ao jornal Informa Cubatão, editado pela Secretaria de Comunicação da prefeitura de Cubatão

Marcelo Ariel durante o lançamento de Conversas com Emily Dickinson
(Foto de José Mário Alves)

Quando e como você descobriu sua vocação para a literatura?
Durante a infância, na biblioteca pública. A biblioteca é o lugar mais importante das cidades, mais importante do que o cemitério, a escola e a igreja. A biblioteca é o hospital da Alma. Alexandre, o Grande, que foi educado por Aristóteles, considerava a criação da biblioteca de Alexandria sua mais importante conquista. Em Cubatão, a biblioteca se localiza no prédio da antiga prefeitura, ex-centro do poder, que também já foi uma escola pública, fato por si só, indicador da importância maior da biblioteca para a vida da cidade.

Você estudou em Cubatão? Suas experiências na escola te ajudaram a começar seu trabalho?
Fui realmente alfabetizado por minha vizinha, Dona Marlene, que dava aulas de reforço na sua casa e aprendi a ler muito cedo, minhas experiências na escola pouco acrescentaram ao que aprendi com minha mãe, com minha vizinha e com meus amigos, no fundo, a verdadeira escola é a exploração do campo de alteridades e a leitura dos clássicos, o resto é a falência do conhecimento patrocinada pela visão mercadológica da vida.

Qual a característica das suas obras (poemas, romances, ficção etc.)? De onde vem a inspiração?
Não acredito em inspiração, nem em talento. Talento é atenção concentrada e trabalho intenso. Inpiração é sempre uma idéia inicial que nada significa sem a lapidação e a obsessão pela harmonia. O que caracteriza meu trabalho é a fidelidade a uma visão do mundo onde não existem fronteiras entre a filosofia e a poesia, uma visão mística e unificadora da vida interior e da vida exterior, que é contantemente e erroneamente confundida com elitismo e hermetismo. Quem lê atentamente meus livros tem acesso a uma visão original do mundo.

Quantos e quais livros você já publicou?
Pela ordem de publicação: Me enterrem com a minha AR 15 (Selo Dulcinéia Catadora, 2007), Tratado dos anjos afogados (LetraSelvagem, 2008), O céu no fundo do mar (Selo Dulcinéia Catadora, 2009), Conversas com Emily Dickinson e outros poemas (Multifoco/Selo Orpheu, 2010) e Samba Coltrane (Yi Yi Jambo, 2010).

Quais os projetos futuros?
Tenho dois livros no prelo, que serão lançados no decorrer deste ano. A vida de um escritor latino-americano na cidade de Cubatão não é fácil, mas resisto a mudar de cidade, amo Cubatão com todas as minhas forças e acredito que essa declaração pode soar como loucura ou hipocrisia para a maioria dos que vivem aqui, poucos amam esta cidade. Meu projeto é viver em Cubatão com dignidade e não abandonar minhas raízes.

Há quantos anos você mora em Cubatão? Onde?
Moro em Cubatão desde os 4 anos de idade, estou com 42, no Jardim Costa e Silva, que deveria mudar de nome, é um lugar muito bonito para servir de homenagem a memória de um general e presidente não-eleito do regime ditatorial, Cubatão precisa renascer e ser reinventada.

Fale um pouquinho da sua vida pessoal, família etc.
Minha vida pessoal não é importante. A poesia se alimenta de tudo o que é impessoal, do encontro com as alteridades e  existe uma distância enorme entre vida pessoal e vida interior, vida interior é algo raro nos dias de hoje, sem a vida interior que é alimentada pela leitura de bons livros, pela boa música, pela luta pela dignidade, pelo encontro e pelo diálogo com o Outro, não existe vida, apenas uma existência vazia. Existe apenas a vida-praça-de-alimentação e a vida-monetária que são a morte da Alma.

O jornal ainda publicou um trecho do poema Conversando com Emily Dickinson:

doce e raro
é esse silencioso equilíbrio
entre pensamento
e expressão,
para nós
um equivale ao céu
e o outro
à sólida ilusão do chão
por hábito
em ambos
ignoramos
a mão
de uma divindade
enquanto sonhamos
abrindo
essa gaiola sutil
que chamamos
realidade

 

 

 

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