sábado, 9 de julho de 2011

Ademir Demarchi

Máquina de escrever usada por Pagu

Patrícia Galvão, a Pagu, "Musa-mártir antropófaga" do modernismo, como a definiu Décio Pignatari, foi escritora de múltiplos interesses. Romancista, poeta, crítica de teatro, de literatura, jornalista e militante comunista, teve o registro desse seu variado interesse registrado no estudo Pagu Vida-Obra, pelo poeta Augusto de Campos. Boa parte de sua atividade de escritora foi estampada em A Tribuna, de Santos-SP, onde trabalhou até o fim de sua vida, em 12/12/62, ao lado do companheiro e também escritor Geraldo Ferraz.

Além dos textos dedicados ao teatro, Pagu publicou no jornal uma coluna dedicada à então nascente televisão brasileira. Iniciada a partir de 2/6/56 e intitulada sugestivamente de Viu?Viu?Viu?, essa coluna saía diariamente assinada com o pseudônimo Gim.

Ela a começou 6 anos após a inauguração da primeira emissora de TV na América do Sul, a PRF-3, TV Tupi-Difusora, Canal 3, em São Paulo, que foi o mais ambicioso empreendimento do grupo Diários Associados, de Assis Chateaubriand. Um ano após a inauguração da emissora estima-se que existiam 7 mil aparelhos receptores entre Rio e São Paulo. Esse número multiplicou-se rapidamente e, cinco anos após, época em que Pagu iniciou a publicação de sua coluna sobre tevê, estima-se que existiam 200 mil aparelhos receptores em todo o país.

Gim se transparecia masculino, muito embora em uma ou outra edição o personagem se traísse pelos pronomes numa autoria efeminada. A ambigüidade encontra eco na própria linguagem criada por Pagu, que procurou dirigir-se ao leitor num tom de intimidade - já presente desde o título Viu?Viu?Viu? - próprio dos mexericos, transmitindo uma familiaridade com a televisão e seus bastidores, ao mesmo tempo em que comentava aspectos de algum programa por seu caráter cultural.

Esse tom de intimidade ilustra o comportamento típico à época com relação à tevê, que estimulava a reunião de pessoas para assistir programas de forma comunitária e até mesmo motivava as pessoas a procurar aproximação com os atores, telefonando-lhes, na sede da tevê, de onde se transmitia o espetáculo, para parabenizá-los...

Embora muitas vezes tenha-se retido em banalidades como a intimidade do casal Lolita/Airton Rodrigues e seu programa Almoço com as estrelas, pela novidade que teria o telespectador ao poder "almoçar" em companhia de personalidades do mundo artístico ou em evidência, o olhar de Gim tinha interesse insistente em programas de aspecto erudito como a transmissão de espetáculos direto dos teatros onde se passavam.

Gim comentava da execução de sinfonias de Mendelsson acompanhadas de corpo de balé até a Ópera de Pequim que visitava o país, direto do teatro Municipal de São Paulo. Por essa mesma ótica um dos programas prediletos, comentado semanalmente, era O céu é o limite, onde um candidato submetia-se a um teste intensivo de conhecimentos sobre assuntos como a história da Grécia, por exemplo, travando luta renhida de pergunta/resposta com a direção do programa a ponto de seduzir os "tele-ouvintes".

Numa das colunas, em 1956, Pagu dizia: "Embora as cadeias globais sejam ainda um sonho do futuro, o filme televisionado auxilia a transformar os nossos lares em observatórios mundiais. De nosso acolhedor divan da sala, ou da cadeirinha colocada nas noites frias perto do aquecedor ou do fogo, poderemos observar uma expedição na Antárdida ou assistir a um novo casamento sensacional de novos príncipes, um episódio de guerra de verdade com toda a segurança ou um autêntico quebra-quebra".

 

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