Alessandro Atanes, para o PortoGente
Banca de jornal no Centro de Trujillo no dia seguinte ao anúncio do Prêmio Nobel para Mario Vargas Llosa
Tive a sorte de estar no Peru quando anunciaram o Nobel de literatura para Mario Vargas Llosa. Estava em Trujillo, ao norte de Lima, na manhã de sexta-feira, dia 08, quando os principais jornais editados no Peru traziam a notícia como manchete principal. Hoje apresento o que foi publicado por dois deles: La Republica e El Comercio, ambos editados na capital.
El Comercio ressalta o caráter cosmopolita do autor com a manchete “Peruano universal”. Apesar de ser um jornal liberal (da maneira econômica), ideário do qual Vargas Llosa comunga (ele é colunista do jornal assim como do Estadão), a reportagem ressaltou seus méritos literários. Não é o que parece estar ocorrendo no Brasil. Hoje, em A Tribuna, o crítico Alfredo Monte fez a ressalva de que para o jornais brasileiros Vargas Llosa conquistou o Nobel por suas opiniões políticas, e não por sua escrita.
Bem, o el comercio trouxe uma série de entrevistas com intelectuais e escritores do Peru, de outros países da América Latina e da Espanha. O filósofo espanhol Fernando Savater, o escritor chileno Alberto Fuguet e o poeta peruano Jorge Eslava opinam que o prêmio foi dado também por sua defesa do liberalismo, ainda que Savater tenha feito uma precisa avaliação da relação entre política e literatura na obra de MVLl (sigla usada pelos jornais daqui): “Inclusive aqueles que divergiram de seus juízos – como eu mesmo – agradecemos sempre a clara e limpa precisão de suas exposições e a valentia com que se comprometeu com os argumentos em sua defesa. Sua obra literário está acima da ideologia política mas nunca pretendeu se desentender da razão política. É justo que o prêmio leve em consideração este compromisso”.
Mais à frente, o crítico literário peruano Julio Ortega, trilha o mesmo caminho: “Fomos amigos em sua época esquerdista, quando morávamos em Barcelona, e deixamos de nos ver em sua fase neoliberal. Estou feliz de poder me reaproximar dele, já que sua obra esteve sempre à esquerda dele mesmo”. E isso foi publicado por um jornal que se chama El Comercio, enquanto o jornal que publica os artigos de MVLl no Brasil demite colunista por discordar de suas opiniões (que bom seria que nossa direita fosse formada por Vargas Llosa e não Índios da Costa).
A poeta peruana Doris Moromisato espera que o prêmio seja uma forma de estimular a leitura no país: “O prêmio literário se juntará ao emblemático orgulho de pertencer ao Peru, como sua boa comida ou a beleza mística de Macchu Picchu. O impacto positivo será o aumento dos índices de leitura, pois aqueles que não conhecem suas obras se voltarão a elas e nas classes dizer Mario Vargas Llosa será sinônimo de inserção cultural no mundo”. O jornal trouxe ainda opiniões de Juan Vollorio, ensaísta mexicano, Fernando Iwasaki e Alonso Cueto, romancistas, e Carlos Germán Belli, poeta, e mais os autores peruanos Mario Bellatini, que vive no México, e Daniel Alarcón, nos Estados Unidos, além de editoriais e artigos de opinião.
La Republica foi mais nacionalista. A manchete foi um declaração curta de MVLl: “Sou Peru”; o título da reportagem foi “Vargas Llosa, nosso Nobel”. Entre as declarações, está a do crítico literário peruano Abelardo Oquendo: “Este é um reconhecimento de um reconhecimento. Todos estamos encantados, sobretudo depois de (o Nobel pra Vargas Llosa) ter sido postergado por tantos anos”. O escritor Carlos Eduardo Zavaleta, também do Peru, disse que “foi um ato de justiça” e que, finalmente, todo o Peru o “aplaude de pé”. O jornal também publicou um editorial e ainda dois artigos de colunistas sobre o prêmio.
Escrevi em janeiro aqui mesmo no Porto Literário, uma resenha sobre um ensaio de Vargas Llosa, É possível pensar o mundo moderno sem o romance?, publicado no final de 2009 como introdução do primeiro volume de A cultura do romance, projeto idealizado e organizado por Franco Moretti. Ali, ele defende a literatura como forma de conhecimento do mundo e denominador comum entre as diversas culturas do mundo. Para fechar, duas declarações do próprio Vargas Llosa apontam para estes valores. No El Comercio, ele disse:
Me dá um pouco de vergonha receber o Nobel que Borges não chegou a ganhar. É uma ausência que foi muito justamente criticada, a Academia Sueca também erra às vezes.
No La Republica, foi o seguinte:
Espero que tenham me dado (o Nobel) por minha obra literária mais do que por minhas opiniões políticas.
Mais notas do Peru em próximas postagens.
Olá Alessandro, parabéns pelas Notas Peruanas, ajudam a entender melhor a posição de Vargas Lhosa.
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