sábado, 15 de maio de 2010

Texto de Flávio Viegas Amoreira, deste blog, publicado hoje em A Tribuna, em homenagem a Toninho Dantas, produtor de cultura que morreu nesta sexta-feira (14), em Santos, aos 62 anos.


Toninho Dantas (1948-2010)

Recebi a notícia que pressentia, mas não me permitia crer tão breve: a Arte não tem Réquiem, portanto o teu legado é agora responsabilidade nossa para o sono tranqüilo. Não mais os telefonemas pedindo textos para ontem, não mais as sugestões de homenagens aos que destituídos de memória: a tua memória, garanto mesmo pego numa sexta-feira de nossa boêmia, será responsabilidade dos que te amaram, legião de tantos! que a ti devem a ribalta. Quando podias te permitir um cotidiano, era a luta. Quando o teatro te chamava, era a militância em nome dele que propunhas. Deixas-me manco de alma, perdido de sentidos na nossa ação tão apaixonada da Arte como resistência: nós! sensíveis por extremo num mundo de bruteza. Onde o espírito inquieto pelos que chegam buscando novas sendas? Onde a alma que elevou Santos nacionalmente pelo cinema e pela luta feroz contra todos os preconceitos? O "Curta Santos" que propunhas "Festival de Cinema": visionário raro!

Sabia ser artista e útil além dos limites do palco: raro por renunciar ao teu ofício de protagonista pela carreira de tantos. Nos reconhecíamos numa só mirada: sabia-te de despedida, mas continha para não vira mais desprovido de armadura. Sem intelectualismo, sem erudição descabida: essa é uma carta que tantos Brasil afora te enviam... estava certo um nosso encontro na terça-feira: numa batalha nossa! Nós que comungamos sem trégua contra toda hipocrisia!  Desfeito o trato, mas eu confesso que enquanto ias, um sinal eu tive... Como me carrega o teclado para esse dizer do tanto representastes: o telefone não para, deixas-te nessa costa mítica uma lacuna intransponível pela majestade sem pompas e desabrida como tu vivia. Ah! Teu olhar há de dizer das obrigações por cumprir! Mesmo enfermo, a todos te dispunha! nenhum nome citarei além de ti: todos os ícones a ti devem agora homenagem e fôlego para imortalizar seus feitos.

Quanto em comum tínhamos e esse tanto carrego em mim como bandeira na breve estadia : não te apures! O amor por ti imenso! Eu tanto me fiz menos arrogante, menos intolerante: me humanizaste quando por bobagem contigo irrompia. A sua marca era ser anjo: um desses que apontam sem querer luz além da eterna tua que alumia.... Se agitador cultural tivesse um patrono: seria teu todo santo dia.

Quis o destino na quadra de escola de samba revelasse gravidade de teu destino, o mesmo que numa conversa de botequim já mais aquietado eu sempre ansioso já me resignava a tua patologia: mas ao descer escadarias da Cadeia Velha no raiar do outono, por dentro, eu me dizia... Puseste o poeta perturbado: a Arte é nossa Fé e perdi um irmão de alma, um companheiro de estrada, um parceiro da nossa guerrilha pelo encantamento com ousadia. Foram anos de convivência e sempre correria: agora preciso avisar companheiros de São Paulo, os batalhadores de nosso amor "diferente" e eu que te prometia um monólogo! Vou fazê-lo dedicado a ti inspirado em nosso Jean Genet que tanto nos unia. De ti carrego de tantas noites de cerveja e vinho: quando os dois sozinhos lutávamos na Câmara Municipal por um Fundo de Cultura. Tua mãe morria, mas estavas alí: em nome do outro nome da Vida: tua doce rebeldia. Finalizo com poema dum poeta por ti amado, Maiakovski: "Até logo, até logo companheiro, Guardo-te no meu peito e te asseguro: O nosso afastamento passageiro É sinal de um encontro no futuro".

Minha alma amputada de ti, ainda carrega as nossas lutas! Libertários, hoje a noite foi mais curta.... Toninho Dantas, aurora diz ao mar que o céu se alumia.


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