Jamir Lopes, produtor cultural e Coordenador de Centros Culturais da Prefeitura de Santos
Prêmio Nobel de Literatura de 2010, Mario Vargas Llosa, no seu Breve Discurso sobre a Cultura – publicado, recentemente, com exclusividade pela revista semestral Dicta&Contradicta, (dezembro/2010), tem sido tema de várias reflexões nos principais meios acadêmicos e culturais no Brasil e no mundo.
Neste seu discurso, o escritor peruano enfoca os dilemas da cultura e da educação na atualidade, aborda questões filosóficas e acaba presenteando os leitores com uma defesa apaixonada da importância da cultura para as sociedades contemporâneas - “que faz da vida algo digno de ser vivido”.
Sabemos que ao longo da história, a noção de cultura tem tido diferentes significados e nuances. Por muitos séculos foi um conceito indissociável da religião, da filosofia grega e do direito romano. No Renascimento a “cultura” era empreguinada de literatura e artes; e, com o Iluminismo, finalmente, foi associada ao conhecimento científico.
A cultura sempre estabeleceu hierarquias entre quem a enriquecia e a fazia progredir e quem a desprezava ou era excluido por razões sociais e econômicas. Para ele, a noção de cultura atual se estendeu tanto, que se esvaiu. Assim, “hoje todos somos cultos, embora muitos nunca se quer tenha lido um livro ou assistido a um concerto”.
Mario Vargas Llosa aponta a antropologia como a responsável pela confusão que a noção de cultura se encontra. Os antropólogos, numa vontade de compreender as sociedades mais primitivas que estudavam, estabeleceram que cultura era tudo. Ou seja: a soma de tudo aquilo que o povo faz, diz, teme ou adora. “Essa definição buscava sair do etnocentrismo racista que o ocidente não cansa de se acusar. O propósito não podia ser mais generoso, mas sabemos que o inferno esta cheio de boas intenções...”, ironizou o escritor. De forma correta Llosa esclarece: “uma coisa é estabelecer que todas as culturas merecem consideração, já que em todas elas há contribuições positivas à civilização humana. Outra coisa é dizer pelo simples fato existirem, elas se equivalem...”.
A busca do politicamente correto veio nos convencer de que é arrogante, dogmático, colonialista e racista falar sobre as culturas superiores e inferiores e mesmo as culturas modernas e primitivas. De acordo com esta crença todas as culturas são iguais – expressões equivalentes da maravilhosa diversidade humana.
Por sua parte os sociólogos, empenhados em fazer críticas literárias, teriam incorporado a “incultura” à idéia de cultura, disfarçada com o nome de “cultura popular”. Sendo esta última, considerada o contraponto para a cultura aristocrática ou de elite - que brota dos salões, palácios, conventos e bibliotecas. Já a cultura popular nasce e vive nas ruas, nas tabernas, nas festas, no carnaval – satirizando, por vezes, a elite. Segundo o prêmio Nobel, a obra do autor russo Mikhail Bakhtin e seus seguidores aboliram as fronteiras entre a cultura e a incultura, dando ao inculto uma dignidade relevante.
O especialista foi definido pelo autor como um ser unidimensional que pode ser, ao mesmo tempo, um grande especialista e um inculto. Pois o seu conhecimento ao invés de conectar-se com os outros, isola-se numa especialidade, que é a cela do domínio do saber. Embora já existam muitos mais alfabetizados hoje do que no passado, esta é uma questão quantitativa e cultura tem pouco a ver com a quantidade, e muito com qualidade.
Neste campo, Vargas Llosa, confessou a sua grande preocupação em particular com a educação. Atualmente, nas escolas, os professores ou qualquer outra forma de autoridade parece ter convertido os colégios em instituições caóticas e com concentração de precoces delinquentes. Para o autor, Maio de 68 não acabou com a autoridade – que já vinha sofrendo um enfraquecimento político e cultural. “Os adolecentes provindos das classes burguesas, privilegiadas da França, que protagonizaram aquele divertido carnaval , que proclamou 'É Proibido Proibir', estenderam ao conceito de autoridade o seu atestado de óbito”. Dando legitimidade e glamour à idéia que toda a autoridade é suspeita, perniciosa e detestável e que o mais nobre é desconhecê-la e destruí-la. “A autoridade no sentido romano, não de poder, mas do reconhecimento de uma pessoa ou instituição por sua qualidade e competência, infelizmente, não voltou a ser revivida”.
No processo da cultura, para ele, seria equivocado atribuir funções idênticas às letras, à ciência e às artes. A ciência avança aquilando o velho e o absoleto. Para ela passado é coisa morta, superada pelas novas invenções. As letras e as artes se renovam mas não aniquilam o seu passado, alimentam-se dele e o alimentam. "Cervantes continha sendo tão atual quanto Borges, Velásquez esta tão vivo quanto Picasso", exemplificou o autor. A obra artística e literária, aquelas que alcançam certo grau de excelência, não morre com o tempo – segue vivendo e enriquecendo as novas gerações e evoluindo. “Letras e Artes constituem o denomindor da cultura”, conclui, sabiamente, o prêmio Nobel.
Vargas Llosa, discurso aceptación del Nobel
Discurso de Mario Vargas Llosa de aceitação do Nobel em 07 de dezembro
Prêmio Nobel de Literatura de 2010, Mario Vargas Llosa, no seu Breve Discurso sobre a Cultura – publicado, recentemente, com exclusividade pela revista semestral Dicta&Contradicta, (dezembro/2010), tem sido tema de várias reflexões nos principais meios acadêmicos e culturais no Brasil e no mundo.
Neste seu discurso, o escritor peruano enfoca os dilemas da cultura e da educação na atualidade, aborda questões filosóficas e acaba presenteando os leitores com uma defesa apaixonada da importância da cultura para as sociedades contemporâneas - “que faz da vida algo digno de ser vivido”.
Sabemos que ao longo da história, a noção de cultura tem tido diferentes significados e nuances. Por muitos séculos foi um conceito indissociável da religião, da filosofia grega e do direito romano. No Renascimento a “cultura” era empreguinada de literatura e artes; e, com o Iluminismo, finalmente, foi associada ao conhecimento científico.
A cultura sempre estabeleceu hierarquias entre quem a enriquecia e a fazia progredir e quem a desprezava ou era excluido por razões sociais e econômicas. Para ele, a noção de cultura atual se estendeu tanto, que se esvaiu. Assim, “hoje todos somos cultos, embora muitos nunca se quer tenha lido um livro ou assistido a um concerto”.
Mario Vargas Llosa aponta a antropologia como a responsável pela confusão que a noção de cultura se encontra. Os antropólogos, numa vontade de compreender as sociedades mais primitivas que estudavam, estabeleceram que cultura era tudo. Ou seja: a soma de tudo aquilo que o povo faz, diz, teme ou adora. “Essa definição buscava sair do etnocentrismo racista que o ocidente não cansa de se acusar. O propósito não podia ser mais generoso, mas sabemos que o inferno esta cheio de boas intenções...”, ironizou o escritor. De forma correta Llosa esclarece: “uma coisa é estabelecer que todas as culturas merecem consideração, já que em todas elas há contribuições positivas à civilização humana. Outra coisa é dizer pelo simples fato existirem, elas se equivalem...”.
A busca do politicamente correto veio nos convencer de que é arrogante, dogmático, colonialista e racista falar sobre as culturas superiores e inferiores e mesmo as culturas modernas e primitivas. De acordo com esta crença todas as culturas são iguais – expressões equivalentes da maravilhosa diversidade humana.
Por sua parte os sociólogos, empenhados em fazer críticas literárias, teriam incorporado a “incultura” à idéia de cultura, disfarçada com o nome de “cultura popular”. Sendo esta última, considerada o contraponto para a cultura aristocrática ou de elite - que brota dos salões, palácios, conventos e bibliotecas. Já a cultura popular nasce e vive nas ruas, nas tabernas, nas festas, no carnaval – satirizando, por vezes, a elite. Segundo o prêmio Nobel, a obra do autor russo Mikhail Bakhtin e seus seguidores aboliram as fronteiras entre a cultura e a incultura, dando ao inculto uma dignidade relevante.
O especialista foi definido pelo autor como um ser unidimensional que pode ser, ao mesmo tempo, um grande especialista e um inculto. Pois o seu conhecimento ao invés de conectar-se com os outros, isola-se numa especialidade, que é a cela do domínio do saber. Embora já existam muitos mais alfabetizados hoje do que no passado, esta é uma questão quantitativa e cultura tem pouco a ver com a quantidade, e muito com qualidade.
Neste campo, Vargas Llosa, confessou a sua grande preocupação em particular com a educação. Atualmente, nas escolas, os professores ou qualquer outra forma de autoridade parece ter convertido os colégios em instituições caóticas e com concentração de precoces delinquentes. Para o autor, Maio de 68 não acabou com a autoridade – que já vinha sofrendo um enfraquecimento político e cultural. “Os adolecentes provindos das classes burguesas, privilegiadas da França, que protagonizaram aquele divertido carnaval , que proclamou 'É Proibido Proibir', estenderam ao conceito de autoridade o seu atestado de óbito”. Dando legitimidade e glamour à idéia que toda a autoridade é suspeita, perniciosa e detestável e que o mais nobre é desconhecê-la e destruí-la. “A autoridade no sentido romano, não de poder, mas do reconhecimento de uma pessoa ou instituição por sua qualidade e competência, infelizmente, não voltou a ser revivida”.
No processo da cultura, para ele, seria equivocado atribuir funções idênticas às letras, à ciência e às artes. A ciência avança aquilando o velho e o absoleto. Para ela passado é coisa morta, superada pelas novas invenções. As letras e as artes se renovam mas não aniquilam o seu passado, alimentam-se dele e o alimentam. "Cervantes continha sendo tão atual quanto Borges, Velásquez esta tão vivo quanto Picasso", exemplificou o autor. A obra artística e literária, aquelas que alcançam certo grau de excelência, não morre com o tempo – segue vivendo e enriquecendo as novas gerações e evoluindo. “Letras e Artes constituem o denomindor da cultura”, conclui, sabiamente, o prêmio Nobel.
Vargas Llosa, discurso aceptación del Nobel
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